domingo, fevereiro 01, 2009

Belezas e misérias do jornalismo

Duas das minhas leituras de férias são exemplos do que pode o jornalismo. Nos últimos dias andei agarrado com “Bar Bodega” (Editora Globo), de Carlos Dorneles. E, antes dele, estava grudado em “O olho da rua” (Editora Globo), de Eliane Brum.

O primeiro, de 2007, lembra o caso do assalto a um bar em São Paulo que resultou no assassinato de dois clientes da classe média alta paulistana. O segundo, de 2008, reúne dez grandes reportagens da autora que se dedica a uma apuração de imersão e a uma escrita no estilo literário.

Do caso Bodega nos fica a lição de que o jornalismo chapa branca, baseado apenas em fontes oficiais, que registra declarações de autoridades sem investigar os acontecimentos, pode levar a um crime tão hediondo quanto o que fora noticiado, o chamado “crime de imprensa”, como descrito pelo subtítulo do livro.

Embora, naquele mesmo final de semana, outros assaltos e assassinatos tenham ocorrido na imensidão de São Paulo, somente o caso Bodega foi capaz de “despertar” a elite paulistana para o “problema da violência”, gerando movimentos como o “Reage São Paulo” e o envolvimento de empresários, socialites, artistas e apresentadores de TV.

Além das vítimas não serem as usuais da periferia, o bar pertencia aos atores Luiz Gustavo e os irmãos Tato e Cássio Gabus Mendes. Estava armado o circo justiceiro que levou, por exemplo, Hebe Camargo a bradar em seu programa: “Não podemos nos calar, ou então não poderemos mais sair de casa”.

Sob tortura, um garoto foi forçado pela polícia a “confessar” o crime. Para sobreviver e tentar escapar de mais surras e choques, foi levado ainda a entregar mais participantes. Da sua cabeça zonza foram saindo, dia após dia, nomes de colegas do bairro pobre onde morava. Pronto: para a polícia e, logo, para a imprensa, estava solucionado o caso, com a prisão dos autores do bárbaro latrocínio. O tempo e um competente promotor mostrariam que estavam todos errados.

Por outro lado, das reportagens de Eliane Brum tem-se o exemplo do que de bom pode produzir o jornalismo. São narrativas deliciosamente densas sobre realidades que vão da enfermaria de cuidados paliativos, que ajudam pacientes terminais a viverem melhor seus últimos dias, às experiências das mulheres dotadas do “dom de pegar menino”, no Amapá.

Uma das mais fortes reportagens é a que mostra o lado materno da violência do tráfico, identificando as mães dos meninos que estão condenados a não passar dos 20 anos de idade. Há até uma mãe que paga as prestações dos caixões dos filhos ainda vivos, tamanha a certeza da proximidade da morte.

Erramos

E no meu artigo da semana passada, mais mazelas do jornalismo: além de ter grafado incorretamente a palavra “cônjuge” e escorregado em erros de concordância, o texto foi ceifado sem cuidado pela editoria, que deixou pela metade o seguinte parágrafo final: “Nesta semana houve manifestações de centrais sindicais em defesa da manutenção do emprego. Quando unidos, os trabalhadores podem muito. Tanto para acertar quanto para errar. Por vezes até mesmo conseguem povoar os pesadelos patronais, colocando empresários realmente na situação de risco que tanto gostam de dizer viver”.

[Artigo publicado na edição de hoje do Monitor Campista]

Nenhum comentário:

users online