Estava em um show do Roupa Nova, banda cafona que detesto desde a adolescência, quando pela primeira vez pensei em escrever sobre o assunto que segue. Isso faz bastante tempo. E desde então passei a ficar mais atento a circunstâncias onde vivenciava sensação semelhante.
É que, apesar de não gostar do show, e de ter ido nele parar por uma destas licenciosidades de verão, não tive como negar, ao menos para mim mesmo, que olhava aqueles senhores no palco com certa condescendência. Ou talvez um pouco mais, algo como um quase gostar. E me pus a pensar sobre o que diabos estava acontecendo comigo.
Isso mesmo, me certifiquei de que estou ficando velho, o que não chega a ser uma novidade para mim –já que, como diz um amigo, nasci com 30 anos. Mas esta não foi uma percepção atemorizante. Ao contrário, naquele momento entendi que o que me diferenciava do adolescente que seria capaz de quebrar um vinil do Roupa Nova, deste semi-velho que vos escreve, era a tolerância. Deve ser isso que significa amadurecer.
Comecei a notar que temos uma espécie de dívida mesmo com aqueles com os quais não temos afinidade. Pelo simples fato de sermos contemporâneos.
Nós compartilhamos tantas experiências, bebemos em tanta iconografia comum, moldamos nossa visão de mundo tão mergulhados em um mesmo cenário histórico, combatemos as mesmas causas ainda que com armas, razões e posições diferentes, que seria um desperdício se não compreendêssemos a riqueza desta vivência tão próxima, embora aparentemente tão distante.
É como se aos poucos descobríssemos que todas aquelas coisas muito importantes que defendemos não são tão importantes assim. Ou, dito de outro modo, são importantes para uma abrangência muito restrita se comparada a tudo o que podemos chamar de vida —ou, ainda, diante de tudo o que não sabemos sobre ela. Como diz uma música do El Efecto, “o tempo iguala tudo no final, transforma o absurdo em natural”.
Deve ter sido isso que quis dizer certa vez o escritor Carlos Heitor Cony em um bate-papo no Palácio da Cultura. Com a tranqüilidade de quem tem muita estrada, comentou que vai se corrompendo à medida que fica velho. “Nós velhos somos corruptos”, disse Cony, enfeitando com palavras um sereno sorriso.
É claro que ele não falava em corrupção no sentido que se estampa nas páginas de política dos jornais. Fazia referência a algo mais subjetivo.
Não considero que isso possa servir de desculpa para baixar a guarda. Mas ajuda a redimensionar as batalhas que o sujeito escolhe entrar, atribuindo a elas o peso devido diante de tantos outros aspectos desta passagem pelo mundo.
Hoje, com este espírito, seria capaz de tomar uma cerveja com o meu mais renhido desafeto.
[Artigo publicado hoje no Monitor Campista]
domingo, dezembro 14, 2008
Ao meu melhor inimigo
Postado por Vitor Menezes às 10:15 Marcadores: Gaveta do Povo
15 comentários:
vitinho amore mio vamos tomar um vinho?
não vem de agradinho não, não te perdoei e nem vou te perdoar, ainda sentirás a fúria do meu popozão!!!
Victor , minha religião não me permite bebidas alcoolicas, mas também não somos mais desafetos né? Com amor Antnhoy
Legal o texto, gostei de lê-lo.
Abraco.
PUTZ GRILA!¬¬
HEIN SENHOR MENEZES!
Excelente post, me identifiquei muito, principalmente no que diz respeito a pessoas que nõ gostava, e hj se me perguntarem não saberei dizer pq!!Parabéns
Lindo, Vitinho!!!!!
Aliás, hoje foi o dia de ler belos textos nos blogs. Muito bom!
Mas é assim mesmo, fofo... ainda bem que "envelhecer" (que não é bem isso... é viver mais tempo, ver/sentir mais coisas...) nos deixa mais tolerantes (no meu caso, um pouco menos intolerante... tô na caminhada, embora já bem vivida. es!). E essa tolerância vem do respeito que adquirimos pelo outro diante do nosso desejo de, apenas, ser respeitado.
Bom domingo... e vamo beber uma? Ao contrário de um "anônimo" que assina (rs!) minha religião permite. rsrs
beijão!!
Aamadurecer é também isso.E é muito bom.Acho que os vinte anos são os nossos verões: tumultuados, intensos, sufocantes e tempestuosos. Penso em primavera como algo muito mais aconchegante, suave, sereno, doce, florido, quente, mas sem sufocar, ensolarado, mas sem queimar.Estás em plena primavera,meu caro.Parabéns pelo belo texto.Beijinhos
Gostei muito de ler seu texto!!!Supimpaço!!!!
Vitor, não sabia que estava por fazer parte do próximo governo!
rs rs rs rs, é cada coisa... ô anônimo das 20:25, se você não sabia, nem eu. e continuo não sabendo. e por precaução logo aviso: não pleiteio e não aceitaria nenhum cargo no futuro governo municipal. precisaria acreditar muito nas intenções de um governo para entrar em um desafio desse, o que não acontece com o governo dos garotinhos. pode ser estranho para muita gente, mas pode acreditar: nem todo mundo em campos faria qualquer coisa para arrumar um cargo na prefeitura.
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...e demais comentadores: brigadão aí pelas observações carinhosas sobre o artigo e pelos convites para uma cerveja (rs). Abração para todos!
Sou mais um a parabenizá-lo pelo maravilhoso texto. Sou seu fã há tempos e sabes bem disso. Aproveito para te pedir um favor. Se você tiver o texto que escreveu sobre Léo, poderia me mandar?? Terça fará 7 anos e gostaria de reproduzí-lo no blog. Tenho ele aqui, mas teria que digitar e seria meio complicado.
Um grande abraço!!
Tenho a mesma sensação com relação a estar ficando velho. Penso muito nisso ultimamente. Mas sempre que penso nisso, penso no velho que eu não queria ser, quando era novo. Assim, esse lance da tolerância tem funcionado justamente ao contrário pra mim. Fico cada vez mais intolerante por ficar sempre fazendo leituras sobre o que está por trás dos fenômenos. Nunca gostei do Roupa Nova, e não vou gostar hoje. Ao mesmo tempo, desde quando não gostava inicialmente, admirava-os pelo fato de tocarem bem, e ainda tocam!
Então, meu caro, você será o baterista da nossa banda muito mais pelo El Efecto.
Abração!
Pode deixar, seu Neto. Vou mandar o texto. E, seu Rosselini... eu não disse que gosto do Roupa Nova (rs rs rs), muito pelo contrário. Mas também não me furtaria em tomar uma cerveja com eles (rs rs rs).
E jogar uma partida de War... rsrsrs. Coisa de velho!
Abração!
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