A maior das intimidades
Vitor Menezes
Era uma pessoa tão metódica, mas tão metódica, que, depois de ler na internet que o ser humano solta, em média, 17 puns por dia, passou a dizer para si mesma depois do primeiro pum da manhã: “agora faltam dezesseis”.
Talvez por isso tenha lhe causado tanto desconforto o fato de seu cadarço ter desamarrado enquanto caminhava ao lado do seu novo namorado. Um desastre. Um constrangimento.
O rapaz, de modo inconveniente, se abaixou para refazer o laço do All Star dela. E ela, irritada com aquela intromissão, ensaiou pedir que ele se levantasse, mas lhe faltaram palavras e gestos para dar conta da situação.
Sua indefinição deu o tempo necessário para que ele concluísse o amarrado e se levantasse orgulhoso do trabalho. Com um sorriso, o cavalheiro esperava por algum sinal de aprovação, mas o que ganhou foi um tabefe destes de novela mexicana.
Foi a reação nervosa dela diante daquela inesperada manifestação de intimidade. Nunca fora violada daquela forma. Sim, tivera outros namorados. Sim, transara com outros rapazes. Sim, beijara serialmente em um carnaval de Salvador. Mas nunca ninguém tivera a audácia, até aquele dia, de amarrar o seu tênis.
Deve ser por isso que estão casados até hoje. E ele, por amor e gentileza, nada comenta sobre aquele probleminha dela com a flatulência. Apenas diz para si mesmo, todas as noites, após o 16° pum dela: “Jesus, só falta um”.
segunda-feira, maio 02, 2011
[croniquinha de segunda]
Postado por Vitor Menezes às 00:01 Marcadores: croniquinha de segunda
Um comentário:
Dezessete em dia comum. Parece que nos domingos de feijoada, cerveja e chocolate de sobremesa, o número até triplicava.
Postar um comentário