domingo, outubro 04, 2009

Universidade para “qualquer um”

Dia desses ouvi de um professor universitário, que falava de modo eloquente e mirando efusivos olhos azuis, que a universidade realmente não é para qualquer um. Ele leciona em uma instituição pública, das maiores do país, no curso de jornalismo. E conversávamos sobre os impactos da decisão do STF de acabar com a obrigatoriedade do diploma do curso superior nesta área para o exercício da profissão — que deputados e senadores tentam reverter no Congresso Nacional.

Meu interlocutor comemorava a hipótese de que a decisão iria varrer as faculdades picaretas, os cursos mais fracos, e manteria apenas as boas universidades. Concordei sobre os efeitos na elevação da cobrança de qualidade, o que considerei bom, mas ponderei sobre a dificuldade de acesso que muitos brasileiros passariam a ter, especialmente no interior do país, se a oferta do curso ficasse restrita a apenas às “melhores”.

E foi então que, depois de um pouco pensar, e mirar o teto do restaurante onde almoçávamos, ele ratificou a sua posição: “E quem disse que universidade tem que ser para todo mundo? É para os melhores mesmo”.

Não retruquei o seu argumento. Estávamos em um momento amistoso, não em um debate acalorado, e não seria delicado fazer o clima pesar.

Mas aquele seu raciocínio ficou ricocheteando pela minha cabeça. É que, se por um lado, a universidade faz parte de um sistema de verificação de méritos, por outro, faz parte de um sistema educativo, do qual se espera uma visão mais generosa sobre o ser humano e seu potencial.

Trata-se ainda da diferença entre ver a formação universitária como um fim — como insinua a própria ideia de “formação” —, ou como um começo.

Neste debate da obrigatoriedade do diploma de jornalismo, por exemplo, parte da argumentação dos que defenderam o seu fim diz respeito ao despreparo dos alunos quando saem das faculdades e chegam às redações. Há pouca margem para a compreensão acerca da necessidade de um tempo para a adaptação ao novo mundo profissional. Ninguém, em nenhuma atividade, sai “pronto” da faculdade. E rigorosamente falando, ninguém pode se considerar “pronto” mesmo com anos e anos de profissão.

Não desconsidero que há casos dramáticos. Vivencio, como professor, os problemas de formação dos que chegam para a faculdade acumulando as deficiências do ensino básico. Mas, por outro lado, também testemunho avanços surpreendentes entre os alunos esforçados. Creio que se perdermos a ternura e estabelecermos como medida a competição ao agrado do “mercado” pouco restará de educadores em nós.

[Artigo publicado na edição de hoje do Monitor Campista]

5 comentários:

Splanchnizomai abraçando o amanhã. disse...

Vitor... cara...
você agora foi fundo!

uffffffffaaa!!!

Anônimo disse...

Olá, Vitor!
Muito boa reflexão...
Como educador -e vivenciando os problemas relatados -, de fato, a formação universitária, necessariamente, deve ser encarada como um começo, nunca como um fim!
Abç!
Luiz Jr.

agitadorcultural disse...

Olhar para as Universidade particulares e condená-las pelo que elas são, não melhora em nada o debate, só piora. A universidade pública está longe de ser reduto apenas de intelectuais. Não é reduzindo mais ainda o funil do ensino superior que as coisas vão melhorar. O problema está no ensino anterior e a verdade que está muito, mas muito longe, disso ser consertado.

Anônimo disse...

Vitor, se com obrigatoriedade do curso superior a gente depara com problemas seríssimos na formação acadêmica, quanto mais se estiver tudo liberado. Mais hoje, mais amanhã, essa situação será contornada. Acho que de Gilmar a outros Ministros, o arrependimento deve ter feito morada.

Luiz Eduardo disse...

Comungo do seguinte pesanmento:

O MEC, deveria sim banir muitas instituiçoes de ensino. Leciono em instituiçoes Publicas e Privadas.

As privadas nao são os viloes desse trágica historia. Afinal se olharmos por aí temos ótimas instituiçoes particulares à exemplo PUC, FGV (as melhores escolas de negocio do pais)... e uma gama gigantesca de publicas.

O que deve acabar é a farra de cursos oferecidos e de instituiçoes que são verdadeiras casas da moeda.

Enquanto o diploma de jornalismo para exercer a profissão nao vejo uma necessidade para isto.

Temos hoje ótimos jornalistas espelhados pelo pais que são de diversas areas, seja ela economia, direito...

Luiz Eduardo

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