segunda-feira, outubro 09, 2006

Debate bom para Alckmin e não tão ruim para Lula


Os institutos de pesquisa é que poderão monitorar a repercussão do primeiro debate entre candidatos à Presidência da República neste segundo turno, realizado nesta noite na Band. Mas a impressão inicial é a de que o debate foi bom para Alckmin e não foi tão trágico quanto se poderia supor para Lula.

Alckmin foi firme, bateu duro, demonstrou mais preparo, explorou o caso do dossiê e as outras denúncias de corrupção, esteve na ofensiva na maioria do tempo, mesmo quando Lula buscava dados do governo de São Paulo para forçar uma comparação com o desempenho do governo federal.

Mas Lula enfrentou uma nova situação para o Brasil: foi o primeiro Presidente da República a ser sabatinado tão duramente, ao vivo, na televisão. Esta prática, comum nas campanhas norte-americanas, por exemplo, não havia ocorrido aqui. Em 1998, quando Fernando Henrique concorreu à reeleição, não participou de debates e venceu no primeiro turno.

Segurou as pontas
Para Lula, que não manteve em seu governo a boa prática de conceder entrevistas coletivas com freqüência, o teste de hoje foi duro, mas até que não se saiu tão mal. Demonstrou nervosismo, sobretudo nos dois primeiros blocos. Em um momento quase derrubou um copo de água, em outros franzia a testa irritado, gesticulava, mas não cometeu nenhum grande deslize.

Até mesmo uma confusão com os números, quando citou 170 famílias atendidas em um programa do governo de São Paulo, quando foram 1,7 mil, converteu em seu favor, ao dizer que a diferença é pequena perto das 11 milhões que atendeu com o bolsa família.

É verdade que Lula se atrapalhou com os papéis que tinha que ler ao fazer as perguntas e manipular os dados, o que foi explorado pelo adversário, mas não parece que isso tenha comprometido o seu desempenho.

Para um Presidente da República, ser chamado de “mentiroso”, “arrogante”, irônico”, “desrespeitoso”, na frente de todo um país, não deve ser muito confortável. E, nessa situação, Lula até que se saiu bem.

Alckmin mais seguro
Mas bom mesmo o debate foi para o Alckmin. Afinal, como opositor e como detentor de um índice menor de intenção de votos, acabou saindo no lucro. Saiu-se bem das acusações que lhe foram feitas, como a de que arquivou 69 CPIs — sobretudo porque o eleitorado dos demais estados não estão muito preocupados com isso, e o próprio eleitorado de São Paulo, que lhe deu mais votos que a Lula, pelo visto, também não —, e não perdeu oportunidade de explorar algumas gafes do adversário, como naquele momento em que corrigiu Lula: “O PSDB não tem quatro séculos”.

Guerra fria
Na percepção popular pode não ter ficado tão evidente — afinal, a crença é a de que políticos são todos iguais e partidos não importam muito —, mas em alguns momentos ficou mais claro, como há algum tempo não se via, uma diferença entre direita e esquerda, algo que anda meio desgastado. Lula, por exemplo, ao comentar as objeções de Alckmin à política de aproximação com a China, comentou: “fica difícil debater com alguém que ainda está com a Guerra Fria na cabeça”. Provavelmente foi intencional: Lula procurou voltar a demarcar o seu campo de esquerda, unindo agora os descontentes desta ala que até mesmo seria suficiente para garantir-lhe a vitória, e buscou etiquetar a agenda dos tucanos como privatista, enquanto a sua teria prioridade social.

Também na referência aos “quatro séculos”, quando Lula disse “não queira que eu faça em quatro anos o que vocês destruíram em quatro séculos”, o petista mobilizou subliminarmente a oposição povoXelites, colando em Alckmin o pertencimento a uma espécie de dinastia de gerações e gerações que governaram o país.

Este efeito pode ter resultado. Continua muito forte no carisma de Lula a sua origem popular e as suas fragilidades. Assim como ocorreu no Jornal Nacional, mesmo quando ele vai mal, o povo se compadece, vendo nele um deles que enfrenta os gigantes e nem sempre consegue vencer.

Audiência precisa ser verificada
No caso do debate da Band, é preciso ainda saber os efeitos que podem produzir uma audiência mais limitada. Ainda que para padrões da emissora o debate tenha sido um sucesso, é provável que uma larga faixa da população, especialmente a mais pobre, não tenha trocado o Fantástico, da Globo, pelo debate na Band. E é justamente neste eleitorado que Lula vai melhor, e é onde teria algo mais a perder.

Os jornais desta segunda, se quiserem, no entanto, terão motivos de sobra para fazer festa para Alckmin, contribuindo para consolidar a sua preferência na classe média e nas regiões Sudeste e Sul. Mas o povão, tendo assistido ou não, não viu ou ouvirá repercutido nada que possa mudar a sua intenção de voto.

O debate foi quente — e em um momento o moderador Ricardo Boechat até parou a condução, quando Lula pediu direito de resposta e não obteve — mas teria sido mais divertido se tivesse com a Heloísa Helena e o Cristovam Buarque.

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