sábado, maio 22, 2004

Entrevista com o jornalista
Você percebe que está ficando velho quando começa a ser procurado para dar entrevistas. Tive essa exata sensação quando fui abordado, dia desses, por Tanize Costa, aluna da Oficina de Produção Textual – ou algo do tipo -, capitaneada pelo professor Sérgio Arruda, na Uenf. Aproximando-se timidamente e me chamando pelo nome, Tanize – até então, uma desconhecida - perguntou se era possível que eu desse algumas opiniões sobre, ora, vejam só, blogs, para um trabalho. Respondi que sim, claro, sem problemas. Dias depois, chega ao meu email um texto dela, apontando as questões que eu deveria abordar. Não lembro se estava bem ou mal-humorado quando respondi, mas acabei encarnando o Crooner Dissidente e escrevendo algumas considerações. Acabei achando o resultado bem engraçado. Enjoy it.

“As questões que gostaria de saber de você estão relacionadas a internet como meio de divulgação literária, um meio alternativo dado o restrito mercado literário brasileiro. Se você crê ser este um meio mais democrático, ou o é apenas com relação aos que já tem acesso esse meio, ou seja, já há uma espécie de triagem com relação ao uso da internet.

Triagem ? Algo como "somente os eleitos acessarão o mundo livre da web" ? Ou "creia no click de enter e será liberto" ? Não se esquente muito com esse tipo de resposta. É que estou ouvindo Tom Waits enquanto escrevo. Daí, frases como essas inevitavelmente acabarão surgindo ao longo deste texto. Mas vamos em frente. A Internet, ou melhor, a literatura publicada neste meio, não é exatamente uma alternativa ao restrito mercado editorial. Para mim, tem um caráter de experimentação e divulgação, pontos estes que não possuíam a mesma maleabilidade em outros meios. É aquela história de custo zero e que tais, mas não é um fim em si mesma. Não conheço nenhum escritor que despeje seus textos em sites e blogs que não queira publicar um livro impresso - isso se já não tiver sido publicado. Dessa forma, me arriscaria a dizer que, em certos casos, esta produção literária escoada na Internet é muito mais uma estratégia de marketing do que uma necessidade de produzir literatura. Claro, este panorama está sendo bastante modificado, porque é perceptível o "surgimento" de escritores que estão dispostos a discutir produção literária em meios como este, aliando esta proposta ao marketing. O que é bastante saudável. Talvez até mesmo possa fazer bem aos neurônios. Vou conversar com meus médicos a respeito disso.


A sua visão com relação aos blogs, se são apenas diários eletrônicos, se são válidos enquanto meio de divulgação literária.

Ora, blogas, digo, bolas ! Blogs são ferramentas. E só. Não é questão de pensar para que servem, mas sim o que se vai fazer com isso. O blogueiro - valha o termo - é que vai dar vida à esta publicação, é óbvio. Se quiser estabelecer que haverá discussão e produção literária, assim será. Manja aquela história lendária sobre golens ? São criaturas feitas de lama e barro que ganham vida após colocar um certo símbolo em sua testa - chamado de emmeth, salvo engano. Assim que despertam, obedecem à vontade do dono. Então, vamos a uma frase de efeito: os blogs são os golens interconectados dessa nossa era muderninha.


E se são válidos enquanto meio de divulgação literária, os comentários são sempre válidos, funcionando como interlocutores, ou se restringem a tietagens e/ou pedantismos.

Os blogs literários são os principais elementos no processo de escoamento e discussão sobre produção textual. Seu caráter de interconexão, aliado às possibilidades de dar opinião, meter o bedelho, tornam estes blogs - atenção: estes blogs - ferramentas utilíssimas no que eu posso chamar de fomento à inteligência. Imagine você entrando em contato direto com aquele escritor ou escritora cujos textos te encantam, podendo argumentar sobre este ou aquele trecho, sobre determinado estilo literário, sobre a produção atual da literatura brazuca ? Agora, páre de imaginar e olhe pra tela do computador conectado e perceba que esta atitude está crescendo e encorpando. Trata-se de uma teia, uma máfia, um conluio. Mas a ficha exata sobre isso ainda não caiu. Salto de bungee-jumping por diversos blogs literários e o que pude perceber, em relação aos comentários, é que raramente as pessoas mais antenadas e com disposição para argumentar, deixam seus rastros opinativos. Em geral, o sistema de comentários é utilizado como um mural de recados. Acredito que haja uma certa preguiça (mental, será ?) da nossa parte, no momento de usar esse sistema. Penso que ainda estamos aprendendo a manusear ferramentas como essas.

Também gostaria de saber se você acha que o blog/sites literários podem vir a incentivar a leitura para além da literatura de internet, assim como podem realmente facilitar a entrada de um escritor no mercado literário tradicional.

O conceito exato da palavra "interconexão" deve ser apreendido todos os dias, talvez até repetido como um mantra, para que possamos entender que esta mídia, a Internet, não é, definitivamente, algo ensimesmado.Não publicamos na Internet apenas porque não dispomos de recursos para colocar todas essas palavrinhas em livro impresso. Temos aqui, como já especifiquei lá em cima, olhe lá, uma dupla dinânica: experimentação e divulgação. Há vários casos, no Brasil, de autores que publicaram livros depois de escrever em blogs. Não vou citar nomes, porque não gosto de algumas publicações dessa leva. Mas estes são fatos que não se pode negar. Há um incentivo sim, tanto à busca por autores com os quais você se identifica quanto em relação ao crescimento de uma certa, digamos, preocupação com a literatura contemporânea brasileira. Fique atenta e siga os bons: você não perde por esperar”.

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