Como condenar os traficantes quando o Exército, convocado para "reestabelecer a ordem" na capital, sai metralhando cidadãos comuns em seus carros? Fiquei estarrecida com a morte daquele professor, no Rio, neste final de semana. Foi um crime bárbaro. Ao que me consta, em momento nenhum os soldados do Exército foram ameaçados pela vítima. Ainda que o professor tivesse desobedecido à ordem de parar — versão que começa a ser desmontada pela Polícia —, isso não justificaria, jamais, a sua morte.
A presença do Exército nas ruas pode dar a impressão de que a população está agora mais segura, mas, na verdade, os soldados são preparados para a guerra, não para a segurança da população comum. Na sua frente, quem desobedece a qualquer ordem vira inimigo — e, na guerra, os inimigos devem morrer. Só que, no atual contexto de medo e terror que domina as ruas do Rio, a desobediência a uma ordem de parar, à noite, pode ser perfeitamente explicada, dado que este artifício é frequentemente utilizado pelos bandidos.
As Forças Armadas podem, sim, atuar no combate ao tráfico de drogas, mas em outras frentes. Depois de saber do assassinato do professor por soldados do Exército, concordo que a tarefa de subir os morros não pode, de maneira alguma, ser delegada a eles. O número de tragédias poderia ser bem pior. Mas, num trabalho conjunto com a Polícia Federal, as Forças Armadas podem ajudar a inibir a entrada de drogas através das nossas fronteiras. Só fechando bem as portas de entrada da droga no país é que poderemos diminuir o poder dos traficantes.
Por outro lado, precisamos de uma Polícia mais aparelhada e humanizada. É uma árdua tarefa, que pode durar muitos e muitos anos. A médio e longo prazo, precisamos incutir nas mentes dos nossos policiais e carcereiros um sentido ético. Não basta bradar: corruptos! Claro que seria ótimo fazer uma "limpeza" nos presídios, mandando embora todos aqueles que, em troca de dinheiro, permitem aos traficantes comandar seus subordinados cá fora. Mas para onde iriam essas pessoas? Com certeza, engrossariam os quadros de traficantes, e seriam até mais valorizados, já que detêm conhecimentos importantes dentro da Polícia.
Talvez tenhamos relegado os policiais à própria sorte anos e anos. Salário baixo não é desculpa para corrupção, assim como pobreza não é justificativa para virar ladrão. Mas só não entram no mundo do crime aqueles que não conseguem enxergar um sentido ético naquilo que fazem. Então, além de bons salários, os policiais precisam aumentar a sua auto-estima, precisam orgulhar-se do que fazem, entender que o pouquinho do seu trabalho é importante para que todos possam viver em tranqüilidade. Algo como o que acontece naqueles filmes americanos, em que os policiais têm orgulho do seu trabalho e vibram sempre que um bandido perigoso vai para detrás das grades...
E não é só isso. Dependentes de droga devem ser tratados como realmente são: dependentes. Ou seja, pessoas que precisam de tratamento, não de punição. Cobrar deles que parem de comprar drogas para acabar com o tráfico é por demais ingênuo. Por que, ao invés de presídios, não abrimos mais clínicas de recuperação, com equipes multidisciplinares, espaços agradáveis para que todos que queiram se curar da dependência química tivessem a oportunidade de fazê-lo? Quase sempre, é preciso muito dinheiro para se internar em uma clínica de recuperação.
As campanhas anti-consumo de drogas devem começar bem cedo. Na verdade, muito antes da escola. Devemos pensar nas drogas quando nossos filhos acabam de nascer. É preciso que os pais pelo menos se conscientizem de sua parcela de contribuição nesta história toda. Criança precisa de muitas coisas que podem ser compradas com dinheiro. Mas precisam também de amor, afeto. Todos os pais amam seus filhos — na verdade, não é disso que estamos falando.Os filhos precisam de um amor que saia de dentro de si mesmo. Bem, isso é assunto para outro artigo. Abraços a todos!
quinta-feira, março 06, 2003
Postado por Anônimo às 11:35
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