domingo, março 31, 2013

[croniquinha de segunda]


A testemunha

Vitor Menezes

Adalberto era o responsável pela caldeira. Era dele a tarefa infinita de manter o inferno aceso com os celsius suficientes para a produção não parar na usina de Torres Altas. Jamais uma falta. Jamais um contratempo. Jamais uma contrariedade. Jamais um questionamento. E naquela noite quase igual, quando toda a turba dormia, Adalberto descobriu para o que de fato servia.

Foi quando um carro preto entrou pelo portão dos fundos, por onde à luz do dia entrava a diretoria, e nele estavam homens que Adalberto não conhecia. Um alto magro de bigode. Outro de chapéu escuro e óculos de grossa armação. Passaram sem ser parados pelos seguranças da portaria e seguiram para o galpão.

Adalberto de longe olhava, estranhando a movimentação. Como pode que ele, o chefe, que a tudo controlava, não soubesse da situação?

Na área ampla pararam o automóvel. Juntos desceram por ambos os lados e se dirigiram ao porta-malas. O bigodudo trazia as chaves, e moveu com vigor o tambor da fechadura. O segundo ajudou a erguer a tampa. Os dois lançaram-se com profissionalismo sobre o cadáver que dali se alçaria. E o corpo inimigo foi atirado ao fogaréu.

Adalberto teve até a intenção de interferir no que assistia. Mas pensou que talvez fosse coisa que a ele não pertencia. Gente graúda, de poder, endinheirada. Muito além do seu entendimento. Decidiu que não vira nem ouvira nada. E que nem ali estava naquele momento.

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